Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]
TRIGGER WARNING: Este post fala sobre automutilação.
Para muitos de vocês não faz sentido. "Até parece que vai adiantar alguma coisa, que te cortes". Para muitos de vocês trata-se de uma piada. "Eheh emos, cortem antes os pulsos ou o pescoço". Eu entendo que não vos faça sentido, não entendo como fazem disto uma piada.
A maioria (senão todas) das pessoas que participou na hashtag #CutForZayn fê-lo, assumidamente, para chamar a atenção - do Zayn. E agora vocês dizem-me: "Mas isso é estúpido", e eu concordo. De maneira nenhuma a automutilação iria fazer com que o rapaz voltasse à banda, aliás até faria pior, pois o que foi uma escolha feita em consciência e em prol da sua felicidade, acabaria por se tornar algo traumatizante visto saber que essa sua opção fez com que tantos milhares de pessoas se magoassem.
Elas fizeram-no para chamar a atenção, mas há quem não o faça. E a minha maior preocupação aqui, como referi no próprio dia, no meu twitter, é a banalização de um assunto muito sério. Volto a repetir que entendo que não vos faça sentido, mas não entendo como fazem disto uma piada.
Primeiro deixem-me educar-vos: automutilação é quando alguém se magoa fisicamente de propósito. A forma mais conhecida é através de cortes (nos braços, nas pernas, onde seja), mas não é exclusiva. Quem se auto-mutila pode fazê-lo também através de beliscões na pele, queimaduras (com pontas de cigarros ou com isqueiros), podem morder o interior da boca até fazer ferida, podem dar murros e/ou cabeçadas na parede, podem arrancar os próprios cabelos... As formas mais conhecidas são os cortes ou queimaduras por serem as mais visíveis (embora quem o faça, normalmente esconda ao máximo as cicatrizes).
Para chegar ao ponto de se magoar a si próprio, essa pessoa já não tem auto-estima (leia-se autoconfiança e amor-próprio) e sente uma dor emocional tão grande que a forma que parece mais eficaz de lidar com essa dor psicológica é ao transformá-la em dor física. Para quem se mutila, quando a lâmina corta a pele a sensação é de alívio - daí se tornar viciante -, porém logo de seguida vem um enorme sentimento de culpa, daí a grande maioria das pessoas esconder que o fez.
Parar a automutilação é muito difícil, e quem consegue parar vive para sempre com “o fantasma”. Seja quem faz e quem já fez e está “limpo”, existe sempre o problema dos “triggers”. Os “triggers” (gatilhos) são acontecimentos que causam uma resposta psicológica negativa - que pode ser uma recaída. Os movimentos #CutForBieber e #CutForZayn para além de serem estúpidos, são altamente triggering e uma falta de respeito para quem já sofreu e até mesmo para quem sofre com isso, pois como se não bastasse ter que olhar para as próprias cicatrizes ainda são obrigados a ver as cicatrizes dos outros.
Quando, por sua vez, associados a esses movimentos aparecem os gozões com comentários tristes como “cortem antes o pescoço” e o que vocês não entendem é que quem fez isso para chamar à atenção vai ler o comentário e pensar “tu não entendes que nós fazemos qualquer coisa para que o Zayn volte para a banda”, mas quem sofre disso ‘a sério’ vai ler como “não vales nada e mais valia morreres”. Estão a fazer com que essas pessoas se odeiem ainda mais e se sintam mais culpadas.
Somos todos Charlies, mas taggem bem as vossas Charliesses e não se esqueçam dos trigger warnings quando vão publicar algo que tenha conteúdo mais sensível, para poderem ser evitadas por quem não as quer ver.
E sejam amigos.
A Sara odeia-vos.